“Esse mapa certamente sofrerá alterações em função dessas discussões, está tudo em construção”, diz coordenador do Gerco
Thereza Felipelli
A Câmara de Ilhabela ficou pequena para acomodar tantos interessados em acompanhar o Fórum de “Gerenciamento Costeiro, Comunidades Tradicionais e Turismo Sustentável”, realizado durante todo o dia.
Organizado pela Associação de Engenheiros e Arquitetos de Ilhabela e pela 11630.org –Associação Para uma Cidadania Participativa – em conjunto com o Instituto Ilhabela Sustentável, Observatório Social de Ilhabela e com o apoio de outras entidades representativas da Sociedade Civil da cidade – o encontro está em sua segunda edição e foi intitulado “Pensando a Ilhabela que Vivemos”.
O objetivo principal foi esclarecer e informar sobre a legislação e as consequências que as alterações no zoneamento ecológico-econômico (ZEE) podem trazer, sobretudo para as comunidades tradicionais, bem como apontar modelos e boas práticas que possam ser implementados no ZEE – Gerenciamento Costeiro (Gerco) e na Política Municipal de Desenvolvimento Urbano e Turístico de Ilhabela.
O encontro contou com a participação de diversos palestrantes, mas a boa notícia para os moradores das comunidades tradicionais de Ilhabela foi dada pelo biólogo Luiz Roberto Numa de Oliveira (Bepo), coordenador do Gerenciamento Costeiro (Gerco) de São Paulo pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Diretor do Centro de Zoneamento Ambiental da Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo. Segundo ele, muito provavelmente as comunidades tradicionais deverão permanecer como Z2 e muitos outros pontos devem sofrer alterações em conjunto com a população, ao serem realizadas audiências públicas nos quatro municípios.
Bepo explicou que o Litoral Norte foi pioneiro, em 2004, quando promulgou seu primeiro ZEE, que está em revisão há mais de dois anos. “Mas o trabalho não é só técnico, é também muito político, no sentido do entrechoque de interesses da sociedade, que é o ponto onde estamos agora. O decreto que regulamenta o que pode ou não em cada zona é uma costura muito complexa e difícil, porque vincula licenças a que todos estarão sujeitos depois. Temos mais de meio caminho andado, mas ainda não finalizamos”, enfatizou.
Processo de revisão
“Percebemos que ainda aqui na região essa discussão precisa estar melhor posta, disseminada, entendida e negociada pela população”, declarou Bepo. “Como são questões que irão afetar a vida de todos nos próximos 10 anos é importante que façamos uma boa norma, que tenha concordância da grande maioria, que traduza os anseios da sociedade. Então esse é um dos motivos que o secretário Bruno Covas determinou que fizéssemos uma audiência aqui na ilha, que acontece no dia 12. Ela é prévia a audiências que serão realizadas depois. Ainda voltarei mais vezes pra discutir com quem tiver interesse. Faremos isso nos outros municípios também”, continuou o biólogo.
Segundo Bepo, a Prefeitura vem abrindo espaço para conversas, inclusive com os moradores das comunidades. “O prefeito Toninho Colucci tem adotado uma postura de rever até mesmo as questões que primeiro haviam sido sugeridas como mais apropriadas, acho que isso é um grande ganho da sociedade”, salientou. “Está tudo em construção, não assinamos nada com sangue ainda. E não temos uma data mágica pra entregar esse produto”, brincou o biólogo, que explicou que, pelas leis que hoje regulam a questão, o ZEE vige durante 10 anos e o prazo é até dezembro de 2014.
Debate
Outras palestras e debates foram realizados ainda durante o encontro. “Esse mapa certamente sofrerá alterações em função dessas discussões. Está tudo em construção”, disse Bepo ao ser questionado sobre o decreto e o mapa pelo procurador do Ministério Público (MP), Tadeu Salgado Ivahy Badaró, que perguntou: “Mapa e decreto, o que vem antes e o que vem depois?”
“Estamos trabalhando em questões simultâneas. O problema do decreto é que são tecnicalidades, questões difíceis de conseguir discutir numa plateia leiga e ampla, então procuramos definir detalhes no decreto e na hora da discussão no mapa é que as pessoas ficam sabendo o que há no decreto”, disse Bepo, que explicou que o grupo setorial do Litoral Norte é composto por oito membros do Estado, oito das prefeituras, oito da sociedade civil e oito suplentes. “A perspectiva agora é terminar algumas questões que estão no decreto e levar isso para análise jurídica, pra ver se o que a gente propõe tem fragilidades, para então ser levado adiante. Ficamos dois anos tratando o decreto e agora tratamos o mapa”, explicou. “O que se convencionou no grupo setorial é que a discussão parte de uma proposta do município. É ele que tem mais ferramentas, instrumentos sobre o que acontece em seu território e sobre políticas públicas em andamento”, continuou Bepo, que ressaltou que estão realizando fóruns setoriais discutindo o assunto desde o dia 28 de junho.
Plano Diretor e audiências
Durante o debate, o vereador Luizinho da Ilha comentou que deveria haver audiências em Castelhanos e Bonete – onde moram os interessados diretos nas mudanças – e perguntou se não há como “amarrar” o gerenciamento costeiro com o Plano Diretor (PD) da cidade.
“Concordo com seu pressuposto, se há decisão de renovar o PD é importante que corra junto com o gerenciamento. Com relação à questão de vinculação, foi promulgada em 2011 uma lei federal que estabelece essas vinculações entre zoneamentos ecológico econômico e PD, estabelecendo claramente que o PD deve se vincular ao que o zoneamento determina. Primeiro se faz o planejamento regional de maior escala e a partir daí se entra com o planejamento local de maior detalhe”, explicou.
“Com relação a audiências em Castelhanos e Bonete, acho que é uma decisão da sociedade, não nos furtamos de ir a lugar nenhum. Estivemos há 15 dias nos dois locais conversando com a comunidade e iremos sempre que for necessário”, continuou Bepo.
Pousada pode
Luizinho perguntou ainda o que de fato pode ou não em cada zona, questionando, por exemplo, se podia haver pousadas no Bonete, caso permaneça como Z2. “Eu sinceramente não entendi bem a celeuma que está acontecendo. Empresas, pousadas, hotéis e restaurantes sempre foram possíveis em Z2, nunca houve esse problema, até porque boa parte hoje da região norte e sul da ilha é Z2 e lá há pousadas e restaurantes. A questão que se colocou em determinado momento foram os condomínios. Em principio, quando o decreto de 2004 foi pensado, se pensou que também poderiam fazer condomínios. Só que isso estava mais implícito que explícito. O que aconteceu é que aparentemente se iniciou um processo de tentativa de aprovação de loteamentos como se condomínios fossem. O que estamos tentando fazer é construir uma redação em decreto que está em obras onde podemos separar o joio do trigo nessa questão” respondeu Bepo.
Tadeu, do MP, complementou a resposta: “Não vejo nenhuma ilegalidade em permitir pousadas em Z2”, declarou. “Isso jamais foi alegado. A posição da Procuradoria do Estado acho que também já está clara. O decreto da Baixada Santista diz que em Z2 pode atividades de ecoturismo, definidas como atividades de recreação, lazer, inclusive com o suporte necessário, como pousadas e restaurantes. Se permite trilha é natural que tenha um restaurante pra comer e uma pousada pra quem não quiser voltar no mesmo dia. O MP não tem intenção de mandar derrubar pousada nenhuma no Bonete. Não há ilegalidade nenhuma nisso”, afirmou ele, que ressaltou ainda que, conforme o zoneamento, são permitidas estruturas náuticas adequadas, que vão de classe 1 a 5.
Apelo
Do Instituto Ilhabela Sustentável, Gilda Nunes pediu a Bepo para que o mapa apresentado na audiência no dia 12 seja o vigente e não o apresentado pela prefeitura. “Z4 em Castelhanos e Bonete está ultrapassado. A proposta foi votada, mas não tem mais validade alguma, deveríamos partir do mapa atual e na audiência publica vermos o que fazer”, sugeriu.
Segundo Gilda, não só 14 pontos não fechados no texto, mas uma série de documentos protocolados por entidades não tiveram retorno algum do Gerco. “Não dá pra chegar a uma conclusão sem ter esses 14 pontos discutidos e fechados. Fizemos uma pintura de mapa alternativo porque estávamos desesperados e achávamos que dia 28 (quando as propostas foram apresentadas) era o fim das discussões”, disse ela, que deu os parabéns ao Estado, que não encerrou as discussões.
“Concordo e acho os argumentos razoáveis. A audiência deve assumir caráter de inicio de trabalho e não de final”, respondeu Bepo.
Fonte: Jornal Imprensa Livre